sábado, 8 de janeiro de 2022

A rede que incita a violência contra população LGBTQIA+

Descrição para cegos: foto da deputada Natália Bonavides discursando na tribuna da Câmara Federal, tendo o microfone à sua frente. Ela está usando máscara de proteção.

Por Mabel Dias (observadora credenciada)

Os meios de comunicação ligados a extrema direita no Brasil têm adotado uma prática na produção de reportagens sobre pautas que eles desprezam. Mesmo de maneira sutil, insuflam sua base para atacar, com discursos de ódio que geram discriminação e violência, setores vulnerabilizados da sociedade, como mulheres, população negra, indígenas e LGBTQIA+. 

Um desses meios foi a revista Oeste, que publicou uma matéria sobre a proposta da deputada federal Natália Bonavides (PT-RN), que através do projeto de lei 4004/2021 propõe tratamento igualitário para casais LGBTQIA+ no momento que seu casamento no civil seja declarado. Num país em que a cada hora, uma/um LGBT é agredido, o site da revista publica a seguinte manchete: “Termo ‘marido e mulher’ pode ser abolido de casamentos civis”. A reportagem é assinada por Berenice Leite, que em seu perfil no Instagram se define como “jornalista raiz”. A matéria em si segue os padrões jornalísticos, mas o título distorce o real propósito do projeto da deputada.

Acessando o site da deputada, uma das notícias publicadas por sua assessoria diz que o objetivo do PL 4004/2021 é fazer uma mudança simples no Código Civil, como meio de garantir que as pessoas LGBTQIA+ não sofram discriminação na hora de ter seu casamento declarado. Aqui o link para acesso da informação completa: 

Em outra postagem no site da deputada, a sua assessoria coloca a mentira que vem circulando nas redes digitais sobre o projeto e a verdade acerca do PL, e informa que Natália Bonavides tem sido alvo de discurso de ódio nas redes digitais: “Não é verdade que o projeto tira expressões como pai e mãe das certidões de nascimento. Isso é mentira. Assim como não é verdade que padres e pastores deixarão de usar “marido e mulher”. O projeto trata unicamente da cerimônia civil. Não retira direitos, pelo contrário, inclui.” Você pode conferir a informação completa aqui: 

Importante lembrar que a deputada Natália Bonavides foi alvo, em dezembro, de ataques machistas por parte do apresentador Carlos Massa, mais conhecido como Ratinho, do SBT, em um programa de rádio. Ele também sugeriu que a deputada fosse metralhada por apresentar este projeto de lei, que, segundo ela, visa apenas não causar discriminação a casais LGBTQIA+ no momento de firmar o casamento no civil. No projeto, apresentado pela deputada, não há menção de que o termo “marido e mulher” serão abolidos no momento das celebrações de casamentos, como afirma o título da matéria assinada pela jornalista da revista Oeste, Berenice Leite.

O Instagram do portal R7 republicou um trecho da reportagem da revista Oeste em seu perfil, e não colocou a posição da deputada sobre o PL que ela propôs. O portal R7 faz parte do Sistema Record de Comunicação, cujo dono é o pastor e líder da Igreja Universal do Reino de Deus, Edir Macedo, aliado de primeira linha do presidente Jair Bolsonaro, que vem realizando uma perseguição sistemática contra a população LGBTQIA+, destruindo políticas públicas direcionadas a esse público. O título escolhido para o card, publicado no Instagram é o mesmo da matéria da revista Oeste, desinformando o público que acessa a conta do R7. Mais de cinco mil comentários foram postados. 

Descrição para cegos: print de rede social com nomes e fotos dos perfis manchados para evitar identificação. Notícia na rede social do portal R7 diz: “A deputada federal Natália Bonavides (PT-RN) apresentou um projeto de lei (PL) que tem como objetivo modificar os termos da declaração feita na cerimônia de casamento civil para “assegurar o tratamento igual entre casais”. O PL prevê que a presidência da cerimônia efetuará o casamento com uma declaração que não faça referência ao gênero dos nubentes, o que, segundo a parlamentar, tem causado constrangimento para casais homoafetivos. Com informações da página @revistaoeste. Saiba mais no #portalR7, por meio dos stories ou link na bio. #R7 #JR”. Abaixo os comentários das/os seguidoras/es do perfil. Um deles diz: “Vindo do PT pode esperar só o pior.” Mais um diz: “que bom que no Brasil vai tudo bem. Não tem fome, violência dá até para pensar em leis sem sentido.” Outro diz: “Essa deputada precisa arrumar outra lavagem de roupa, já que não faz nada que preste para o RN”. 






 Descrição para cegos: print de comentários em rede social com nomes e fotos dos perfis manchados para evitar identificação. Um deles diz: “Agora pronto” Outro afirma: “Ao invés de fazer algo que preste, estão se importando com coisas que não se deve mexer. Aff. Esse povo tinha que ser arrancado com raiz e tudo.” Outro diz: “Pelo amor, cada vez pior”. Mais um diz: Muita falta do que fazer”. Outro diz: “Ah para neh!” Outro seguidor do portal diz: “Família é de Deus! Quem é contra, não é de Deus!!!!”. O último comentário no print diz: “vai cagar mimimimimi aff”.



No site da revista Oeste foram 30 comentários. Todos de homens. No entanto, não há fotos e não é possível saber se são pessoas mesmo ou robôs.






Descrição para cegos: print de comentários retirados do site da revista Oeste com nome do perfil manchados para evitar identificação, que diz, em caixa alta: “Esses petistas apresentam cada merda!!!!. A preocupação é tão somente destruir famílias e nada mais. Cada projeto imoral! Isso é pra ser julgado nos cabarés?





Descrição para cegos: print de comentários retirados do site da revista Oeste com nomes dos perfis manchados para evitar identificação. São dois comentários. Um diz: “Olha, constrangimento por constrangimento, todo cidadão honesto (cuja soma é muito maior que LGBTs e petistas juntos) se sente constrangido ao ver Lula e tantos outros fora da prisão. Neste caso não precisa reescrever a lei. Basta aplicá-la.” O segundo comentário diz: “Esta deputada tem com certeza problemas afetivos. Isto é falta de um tanque cheio de roupa encardida para lavar...”






Descrição para cegos: print de comentários retirados do site da revista Oeste com nomes dos perfis manchados para evitar identificação. Dois comentários. O primeiro diz: “Senhora, tem que mudar a constituição primeiro”. O segundo diz: “Natalia, sua desocupada, venha cheirar minha virilha!!!”



Em outro card, o Instagram do portal R7 traz esta manchete: “Caucaia, no Ceará, sanciona lei que proíbe linguagem neutra e banheiro para trans em escolas.” Um trecho do texto da postagem diz que, “A prefeitura de Caucaia, no Ceará, sancionou uma lei que proíbe a inclusão de assuntos ligados à sexualidade, linguagem neutra e ideologia de gênero em escolas públicas e privadas do município”.

Mais uma vez, o portal R7 desinforma as/os seguidoras/es. “Ideologia de gênero” é algo que foi criado pela igreja católica nos anos 1990, após a Conferência de Beijing, na China, após feministas e mulheres lésbicas, conseguirem aprovar várias propostas de políticas públicas que incluíam a discussão sobre gênero, e principalmente, sobre direitos sexuais e reprodutivos. Ou seja, não existe nenhuma fundamentação científica teórica sobre esse termo.

A partir daí, essa expressão vem sendo disseminada, e após alguns anos, passou a contar também com a adesão de evangélicos neopentecostais, como os da Igreja Universal do Reino de Deus e de outras tendências, sendo usada para discriminar LGBTQIA+ e o direito ao aborto, sem nenhum embasamento teórico consistente. Para saber mais sobre essa criação da “ideologia de gênero”, é só acessar o relatório “Ofensivas antigênero noBrasil: políticas de estado, legislação e mobilização social”.

Novamente, em nenhum momento, o Instagram do R7 informa isso aos seus/suas seguidores/as, que, claro, comemoram a sanção da lei absurda, como podemos conferir em alguns comentários:






Descrição para cegos: print de comentários em rede social com nomes e fotos dos perfis manchados para evitar identificação. Neste print, são sete comentários. O primeiro diz: “Essa lei deveria ser para todos os estados.” Outro diz: (emojis de palmas) “ao prefeito e aqueles que o apoiam”. Outro comentário: (emojis de palmas) “que sirva de espelhos para os prefeitos de outras cidades”. Outro comentário: “espelho fosco, né?. (Emojis de dúvida e choro). Outro comentário diz: “Concordo”. E o último diz: “Errado não está! Deixem as crianças em paz!”









Descrição para cegos: print de comentários em rede social com nomes e fotos dos perfis manchados para evitar identificação. Neste print, aparecem cinco comentários. O primeiro diz: (vários emojis que identificam palmas) “Meus parabéns aos autores...esse país está ficando insuportável”. Outro comentário diz: (emojis de palmas) “parabéns. Não sei nem pq a possibilidade de ter isso no mundo”. Outro comentário: (emoji de palmas). “As pessoas precisam ter opinião própria e não ser doutrinadas desde criança”. O quarto comentário diz: “tão preocupado com isso tem escola que nem banheiro que funcione tem os alunos não tem nem onde senta tudo quebrado vão toma vergonha!” E o último comentário diz: “Parabéns, seria ótimo se mais estados entrassem nessa pauta pra ver se diminui um pouco essa palhaçada que já está sem limites.”

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