sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Jornalismo e infância: uma pauta esquecida na mídia paraibana 

Descrição para cegos: página do suplemento Correio Criança ilustrada com fotos de várias meninas, algumas mulheres e do planeta Terra. Tem como título “Repórter Teen – A Hora do Planeta”. 

Por Joana Belarmino (observadora credenciada)

Escrevo esse post ainda impactada pelas primeiras imagens divulgadas sobre a invasão da Ucrânia pela Rússia. Na Globo News, as imagens e cenas são repetidas até à exaustão. Uma das preferidas dos âncoras da TV traz uma criança pequena chorando alto, numa suposta invasão a um hospital ucraniano. Lembro-me imediatamente do instigante livro da jornalista americana Susan Sountag, Diante da Dor do Outro.

Sim. Nas coberturas desses acontecimentos de guerra, o sensacionalismo toma conta da imprensa ocidental. A audiência é bombardeada com imagens de horror e sofrimento, e nem as crianças são poupadas. O banquete é tenebroso e pede reflexão. Mas, não falarei sobre o tema hoje. Quero dialogar aqui, sobre o último programa do OPJor, que trouxe a pauta da infância no jornalismo para o debate.

Quando contemplamos a produção midiática da Paraíba dos últimos cinco anos, na perspectiva de conteúdos dirigidos à infância, observamos que essa agenda foi completamente esquecida, excluída das editorias dos profissionais da comunicação e do jornalismo. Nos últimos meses, aliás, imagens e falas de crianças têm aparecido na TV, por conta da campanha de vacinação contra o corona vírus, mas não passam de estratégias de alimentação da própria campanha. Na TV ocidental, nos próximos meses, o choro alto de uma criança pequena alimentará narrativas de terror, enfraquecendo a perspectiva de um jornalismo cidadão e fortalecendo uma produção sensacionalista e irrefletida.

O tema foi objeto de discussão no último OPJor Debate, realizado quarta-feira, 23 de fevereiro, quando a jornalista Marcia Dementshuk e a socióloga Adelaide Alves dias aceitaram meu convite para uma conversa sobre os diversos aspectos da questão. Rememoramos o fato de que o jornalismo paraibano já deu um importante contributo à infância, com suplementos como O Pirralho, o Correinho das Artes, no jornal A União, e o Correio Criança, no jornal Correio da Paraíba, descontinuado em 2015.

Essa produção voltada à criança acabou. As razões são variadas. Os impressos fecharam, a TV e o rádio assumiram o viés eminentemente informativo e sensacionalista voltado aos adultos, e os setores comerciais dos veículos de comunicação disseram adeus a experiências que envolvessem suplementos especiais para o público infantil.

Concordamos num ponto crucial no programa do OPJor: fazer jornalismo dirigido às crianças é coisa muito séria. Há que se firmar parcerias entre os veículos de mídia, as escolas, as comunidades. Mais que isso, há que se mudar o paradigma imperante nas produções de massa, que pensam na criança como um adulto miniaturizado, quando ela deve ser pensada como um sujeito completo e em processo de desenvolvimento, conforme argumentou Adelaide Alves.

E Adelaide foi mais além, afirmando que a infância é uma vítima das produções massificadas, sobretudo naquelas comunidades onde não se reconhece o direito de fala da infância, e onde as crianças são bombardeadas com notícias negacionistas, com a necropolítica e as coberturas que criminalizam a vida de adolescentes e jovens das periferias.

De fato, o jornalismo paraibano, como de resto o jornalismo corporativo brasileiro, vive a era do jornalismo informativo e de serviços. As editorias são também espaços para a replicação de conteúdos, ou para uma cobertura feita em geral de notícias curtas. As especialidades não têm mais vez na agenda local. Reportagens em profundidade, jornalismo científico, análises em economia, cultura e literatura não encontram lugar nessa agenda, com uma única exceção: a veiculação, já por mais de cem anos, do suplemento Correio das Artes, do jornal A União. Os espaços mais fartos são ofertados à cobertura desportiva, às coberturas de política, muito mais publicitárias do que analíticas, à agenda cultural semanal e à violência, diapasão de uma cobertura que não apura, e só informa sobre ocorrências descoladas de uma conjuntura econômica, política e social.

Cavar um espaço para a infância nessa agenda midiática exige trabalho duro, envolvendo formação especializada na universidade; vontade do empresariado de comunicação; interesse dos jornalistas por explorar esse universo, com participação plena das escolas, das famílias e de uma escuta permanente do que diz a ciência sociológica e comunicativa sobre o tema. Se a mídia paraibana relega essa agenda ao esquecimento, os motores de busca nos mostram que jornalismo e infância é um tema de atenção permanente nas universidades brasileiras, que pesquisam, refletem e fazem muitos laboratórios, explorando o potencial infantil em experimentos e oficinas.

Se uma das missões do jornalismo é contribuir para a formação de cidadãos, para a constituição da opinião pública pensante, esse trabalho precisa começar bem cedo. E, na Paraíba, ele já contou com experiências inspiradoras, a exemplo dos trabalhos do professor Welington Pereira, dos jornalistas Walter Galvão e Anco Márcio, que junto com muitos outros, fizeram a era de ouro do jornalismo e infância na Paraíba.







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