terça-feira, 31 de agosto de 2021

'ANTICORPOS NEUTRALIZANTES'

Propaganda enganosa não rende pauta contra anunciante

Descrição para cegos: ilustração funde três imagens, mostrando, à esquerda, três frascos de vacina próximos de uma seringa; no centro, o vírus Covid-19; e, à direita, o braço de uma pessoa recebendo uma injeção.

por Rubens Nóbrega (observador credenciado)


Seria muita ingenuidade acreditar que em meio a tantas crises, inclusive em nosso mercado publicitário, alguma empresa de comunicação recusaria veicular propaganda enganosa denunciada e comprovada como tal.  

Mas não só acreditei como me enchi de esperança de que uma denúncia envolvendo diretamente uma questão de saúde pública, que fiz em forma de alerta no Facebook no início de agosto, rendesse alguma pauta na imprensa local. 
 
Pois bem, no dia 2 deste mês ainda em curso, postei naquela rede social o seguinte alerta aos desinformados, desavisados e incautos em geral: não caiam no ‘golpe’ do teste que laboratórios de análise vendem para medir eficácia de vacina.

Não têm valor científico algum os exames do tipo, anunciados em propaganda de televisão que um laboratório da capital suspendera no início do mês, após questionamentos deste observador, e voltou a veicular ontem (30).

A advertência inicial – agora mantida e reforçada – baseia-se em nota técnica da Agência Nacional de Vigilância (Anvisa), publicada desde o final de março deste ano e endossada pela Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

A mundialmente acatada FDA, a Anvisa dos Estados Unidos, também divulgou informações e orientações contra tal exame. O mais famoso deles atende pelo nome de ‘anticorpos neutralizantes’ e custa entre R$ 250 e 285 reais em João Pessoa.

Apesar de tão aclamadas referências, laboratórios do ramo não dão a mínima para a ciência e faturam os tubos (sem trocadilho) tirando proveito da ignorância de quem se vacinou mesmo desconfiando do poder de imunização das vacinas contra covid.

Uma desconfiança inseminada e disseminada por fake news, negacionismo e induzimento a aglomerações em prol da ‘imunidade de rebanho’. Não por vacinação, lógico, mas por contaminação que já matou mais de meio milhão de brasileiros. 

BUSCANDO RESPOSTAS

No mesmo dia em que vi o primeiro comercial dos ‘anticorpos neutralizantes’ fiz contato com o anunciante. Pedi esclarecimentos por telefone, zap e email. Somente Yasmin, atendente virtual do laboratório, deu-me algum cabimento, fornecendo a relação dos exames em oferta, respectivos preços e modalidades de pagamento. 

Procurei a concorrência. Outros dois laboratórios de porte semelhante fazem o mesmo teste. Um deu retorno. Seu diretor ligou e tentou passar explicações técnicas por telefone. Solicitei por escrito. Facilita tentar decifrar ou traduzir. Enviou-me bulas do kit com o qual fazem o tal exame. Bulas nas quais, evidentemente, o fabricante não cuida da inutilidade científica do teste para o qual o kit foi fabricado. 

Resumindo, apesar de tão e tantos ilibados e idôneos posicionamentos – da Anvisa, FDA, SBIm, cientistas e pesquisadores brasileiros e estrangeiros respeitados mundialmente – a propaganda enganosa e os testes continuam. “A gente faz o exame porque os médicos prescrevem e o cliente nos procura por vontade própria”, justificou um dono de laboratório com quem mantive contato nesse percurso. 

Claro. Se no Brasil temos médicos que não se acanham em prescrever cloroquina contra covid...

POSIÇÃO DO SINAPRO

Procurei também informações, orientações ou esclarecimentos do Sindicato das Agências de Propaganda da Paraíba, através do seguinte questionamento:

- A Anvisa já alertou publicamente que nenhum teste consegue medir eficácia de vacina contra a Covid. O Laboratório (...) está oferecendo teste para detectar suposto nível de proteção de qualquer imunizante aplicado na pandemia em curso. Foi o que vi na tevê e confirmei no atendimento por telefone e contato via zap com a empresa. Pergunto: é lícita e ética essa publicidade?

Em resposta, Eduardo Cury, presidente do Sinapro-PB, inicialmente lembrou que “além da regulamentação da Anvisa, os empreendimentos de saúde também são normatizados por conselhos regionais e federais, que via de regra vedam uma série de práticas consideradas predatórias”. 

Cury recomenda aos consumidores que se sentirem lesados denunciar o logro à Anvisa, Procons e conselhos. E conclui manifestando o entendimento segundo o qual “a boa propaganda entretém, informa e gera receitas de forma ampla, mas não sem limites éticos e a prática do bom senso, principalmente no setor de saúde”. 

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