Escrevo esse
post ainda impactada pelas primeiras imagens divulgadas sobre a invasão da
Ucrânia pela Rússia. Na Globo News, as imagens e cenas são repetidas até à
exaustão. Uma das preferidas dos âncoras da TV traz uma criança pequena
chorando alto, numa suposta invasão a um hospital ucraniano. Lembro-me
imediatamente do instigante livro da jornalista americana Susan Sountag, Diante
da Dor do Outro.
Sim. Nas
coberturas desses acontecimentos de guerra, o sensacionalismo toma conta da
imprensa ocidental. A audiência é bombardeada com imagens de horror e
sofrimento, e nem as crianças são poupadas. O banquete é tenebroso e pede
reflexão. Mas, não falarei sobre o tema hoje. Quero dialogar aqui, sobre o
último programa do OPJor, que trouxe a pauta da infância no jornalismo para o
debate.
Quando
contemplamos a produção midiática da Paraíba dos últimos cinco anos, na perspectiva
de conteúdos dirigidos à infância, observamos que essa agenda foi completamente
esquecida, excluída das editorias dos profissionais da comunicação e do
jornalismo. Nos últimos meses, aliás, imagens e falas de crianças têm aparecido
na TV, por conta da campanha de vacinação contra o corona vírus, mas não passam
de estratégias de alimentação da própria campanha. Na TV ocidental, nos
próximos meses, o choro alto de uma criança pequena alimentará narrativas de
terror, enfraquecendo a perspectiva de um jornalismo cidadão e fortalecendo uma
produção sensacionalista e irrefletida.
O tema foi
objeto de discussão no último OPJor Debate, realizado quarta-feira, 23
de fevereiro, quando a jornalista Marcia Dementshuk e a socióloga Adelaide
Alves dias aceitaram meu convite para uma conversa sobre os diversos aspectos
da questão. Rememoramos o fato de que o jornalismo paraibano já deu um importante
contributo à infância, com suplementos como O Pirralho, o Correinho
das Artes, no jornal A União, e o Correio Criança, no jornal Correio
da Paraíba, descontinuado em 2015.
Essa
produção voltada à criança acabou. As razões são variadas. Os impressos
fecharam, a TV e o rádio assumiram o viés eminentemente informativo e
sensacionalista voltado aos adultos, e os setores comerciais dos veículos de
comunicação disseram adeus a experiências que envolvessem suplementos especiais
para o público infantil.
Concordamos
num ponto crucial no programa do OPJor: fazer jornalismo dirigido às crianças é
coisa muito séria. Há que se firmar parcerias entre os veículos de mídia, as
escolas, as comunidades. Mais que isso, há que se mudar o paradigma imperante
nas produções de massa, que pensam na criança como um adulto miniaturizado,
quando ela deve ser pensada como um sujeito completo e em processo de
desenvolvimento, conforme argumentou Adelaide Alves.
E Adelaide
foi mais além, afirmando que a infância é uma vítima das produções massificadas,
sobretudo naquelas comunidades onde não se reconhece o direito de fala da
infância, e onde as crianças são bombardeadas com notícias negacionistas, com a
necropolítica e as coberturas que criminalizam a vida de adolescentes e jovens
das periferias.
De fato, o
jornalismo paraibano, como de resto o jornalismo corporativo brasileiro, vive a
era do jornalismo informativo e de serviços. As editorias são também espaços
para a replicação de conteúdos, ou para uma cobertura feita em geral de
notícias curtas. As especialidades não têm mais vez na agenda local.
Reportagens em profundidade, jornalismo científico, análises em economia,
cultura e literatura não encontram lugar nessa agenda, com uma única exceção: a
veiculação, já por mais de cem anos, do suplemento Correio das Artes, do
jornal A União. Os espaços mais fartos são ofertados à cobertura desportiva, às
coberturas de política, muito mais publicitárias do que analíticas, à agenda
cultural semanal e à violência, diapasão de uma cobertura que não apura, e só
informa sobre ocorrências descoladas de uma conjuntura econômica, política e
social.
Cavar um
espaço para a infância nessa agenda midiática exige trabalho duro, envolvendo
formação especializada na universidade; vontade do empresariado de comunicação;
interesse dos jornalistas por explorar esse universo, com participação plena
das escolas, das famílias e de uma escuta permanente do que diz a ciência
sociológica e comunicativa sobre o tema. Se a mídia paraibana relega essa
agenda ao esquecimento, os motores de busca nos mostram que jornalismo e
infância é um tema de atenção permanente nas universidades brasileiras, que
pesquisam, refletem e fazem muitos laboratórios, explorando o potencial
infantil em experimentos e oficinas.
Se uma das
missões do jornalismo é contribuir para a formação de cidadãos, para a
constituição da opinião pública pensante, esse trabalho precisa começar bem
cedo. E, na Paraíba, ele já contou com experiências inspiradoras, a exemplo dos
trabalhos do professor Welington Pereira, dos jornalistas Walter Galvão e Anco
Márcio, que junto com muitos outros, fizeram a era de ouro do jornalismo e
infância na Paraíba.
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