A prisão injusta do senhor Ricardo José
e as violações dos direitos humanos
Descrição para cegos: foto mostra as mãos e parte dos braços de uma pessoa idosa segurando as grades de uma cela. |
por Mabel Dias (observadora credenciada)
“O cliente do sistema carcerário brasileiro é o preto, pobre, primário e preso por um crime sem violência", Augusto Arruda Botelho - advogado criminalista
Um idoso de 65 anos está preso, injustamente, na Central de Polícia, em João Pessoa. O senhor Ricardo José Santos da Silva é hipertenso e diabético, e passou mal nesta madrugada, pois devido à grave situação, seu quadro de saúde piorou. O idoso foi preso, acusado de um homicídio que aconteceu no estado de Alagoas. A família dele investigou e descobriu que no momento da digitação do documento que determinava a prisão do acusado pelo crime, trocaram os primeiros nomes. Ao invés de José Ricardo foi digitado Ricardo José, nome do idoso que está detido em João Pessoa. Como algo assim acontece num departamento de polícia? O senhor Ricardo José dos Santos Silva não tem nenhum antecedente criminal. O caso dele foi noticiado nesta sexta-feira, 22, no telejornal matinal Bom dia Paraíba, da TV Cabo Branco. Sua filha foi entrevistada pela repórter Zuila David, em frente ao local onde o pai dela encontra-se ainda preso.
A história do senhor Ricardo José, infelizmente, no Brasil, não é um caso isolado. Essa situação me remete para o sensacionalismo e o espetáculo promovido pelos programas policialescos, que são exibidos diariamente, no horário do almoço, expondo pessoas suspeitas de terem cometidos crimes, e já as tratando como condenadas. Na Paraíba, esses programas se alastram como pólvora e desrespeitam um dos principais preceitos constitucionais, que é a presunção de inocência. Os corpos que são punidos e condenados nesses programas são sempre de pessoas negras e pobres.
Programas violam inúmeros direitos, sob os olhos complacentes de setores da justiça que deveriam fazer algo para acabar com a barbárie que desfila todos os dias e entra nos lares das famílias como se fosse jornalismo. Mas não é. É violação de direitos humanos. Há apresentador que comemora a morte de jovens negros com o jargão usado por milicianos, e exibe em seu programa vídeos compartilhados em aplicativos de mensagens como WhatsApp, mostrando duas adolescentes cavando a própria cova, antes de serem mortas. Esse caso faz parte do relatório “Violações de Direitos de Crianças e Adolescentes em Programas Policialescos” produzido pelo Intervozes, em parceria com o Instituto Alana e a ANDI, e que foi entregue ao Ministério Público Federal este ano. A reportagem foi exibida no programa de Sikêra Jr, o Alerta Nacional, transmitido pela TV amazonense A Crítica e retransmitido para todo o Brasil pela Rede TV!. A reportagem está disponível no YouTube e teve mais de mil visualizações.
Ainda bem que a família do senhor Ricardo José dos Santos Silva investigou o ocorrido e descobriu o erro. Há um advogado cuidando da soltura do idoso, e já pediu habeas corpus, segundo notícia publicada no portal G1PB.
Mas, infelizmente, a maioria das pessoas que se encontram presas injustamente e têm suas imagens violadas nos programas policialescos não conseguem esse suporte jurídico e não sabem que quando um repórter ou apresentador desse tipo de produto obriga uma pessoa custodiada pelo Estado a falar, eles/elas têm o direito constitucional ao silêncio.
A presunção de inocência é apenas um dos direitos violados pelos policialescos. A pesquisa Violações de Direitos na Mídia Brasileira, produzida pela Andi (Agência de Notícias dos Direitos da Infância), em parceria com o Intervozes, Artigo 19 e Ministério Público Federal, identificou, pelo menos nove violações de Direitos Humanos, causadas por estes programas “espreme que sai sangue”. O relatório completo da pesquisa pode ser acessado neste link.
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